Quando
eu entrava em disputas de Banco Imobiliário e War (aviso aos
jovens: jogos de tabuleiro), decidíamos mudar as regras para
fazer com o que elas andassem mais rápido. Quem já passou
horas em intermináveis contendas com dados……..
Depois,
a gente cresce e percebe que há quem tente o mesmo na vida real. Por
exemplo, defenestrar parte da legislação que regula o mercado de
trabalho no meio do jogo é uma opção defendida para acelerar o
crescimento econômico……...
Informatizar,
desburocratizar, reunir impostos e tornar mais eficiente a relação
de compra e venda da força de trabalho é possível e desejável e
certamente irá gerar boa economia de recursos para empresários e de
tempo para trabal………...
O
problema é que por trás do discurso do “vamos avançar”
presente entre os defensores desta Reforma Trabalhista está também
o desejo de tirar do Estado o papel de mediador da relação entre
patrões e empregados, deixando-os organizando
suas próprias regras. Quando um sindicato é forte e seus diretores
não jogam golfe com os diretores das empresas, nem recebem deles
mimos, ótimo, a briga é boa e é possível obter mais direitos do
que aquele piso da lei. Mas,
e
quando não, faz-se o quê? Rezamos?
Quando
alguém promete uma reforma trabalhista sem tirar direitos dos
trabalhadores irá provavelmente:
a)
mudar a CLT e acrescentar direitos aos trabalhadores e tirar dos
empresários (posso contar também a do papagaio que passava trote ao
telefone);
b)
desenvolver um novo conceito do que seja um direito trabalhista
(situação em que o pintor surrealista René Magritte diria: “isto
não é um cachimbo”);
c)
diminuir a arrecadação do Estado junto às empresas e manter os
direitos dos trabalhadores (esperando que o país quebre em 3, 2,
1…);
d)
vai operar um milagre mais espantoso do que aquele de multiplicar
pães e peixes para uma multidão faminta realizado pelo grande sábio
barbudo (neste caso, Jesus, não Marx).
A
sociedade mudou, a estrutura do mercado de trabalho mudou, a
expectativa de vida mudou. Portanto, as regras que regem as relações
trabalhistas e a Previdência Social podem e devem passar por
discussões de tempos em tempos.
Ou
seja, caso se encontrem pontos de convergência que não depreciem a
vida dos trabalhadores e não mudem as principais regras do jogo no
meio de uma partida sem a concordância de todos, as relações
trabalhistas podem passar também.
Essa
discussão não pode ser conduzida de forma autoritária ou em um
curto espaço de tempo. Pois essas decisões não devem servir para
salvar o caixa público, o pescoço de um governo e o rendimento das
classes mais abastadas.
Por
exemplo, falar em imposição de 25 anos de contribuição para
assalariados urbanos e rurais e 15 anos de contribuição para
trabalhadores rurais da economia familiar, como pequenos produtores e
pescadores, sem considerar que os m.ais pobres começam a
trabalhar mais cedo, é desconhecer a realidade – para ser polido.
Em lugares em que estatísticas
de mortalidade apontam para uma sobrevida menor após os 60
anos que a média do país, como o interior Maranhão, os
aposentados não têm o mesmo tempo para usufruir de suas
pensões que em lugares onde a segurança social é maior.
O
Congresso já aprovou a terceirização de todas as atividades de uma
empresa – e não apenas serviços secundários, como é hoje.
É claro que a relação entre prestadoras de serviço e
empresas-mãe precisam de regras melhores no Brasil, porque
muita gente fica ao relento. Mas a aprovação da terceirização da
atividade-fim do jeito que foi feita, dando a possibilidade de
externalizar qualquer função de uma empresa, vai piorar a
vida de muita gente e reduzir a arrecadação da própria
Previdência. Armamos uma bomba-relógio e o próprio Ministério da
Fazenda sabe disso.
Agora
o governo quer aprovar a Reforma Trabalhista, permitindo
que convenções e acordos coletivos de trabalho negociados
entre patrões e empregados prevaleçam sobre a legislação
trabalhista, mesmo que isso signifique perdas aos trabalhadores, será
entregar o galinheiro à raposa. Jornadas de trabalho mais longas,
que devem ter impacto na segurança e na saúde dos empregados e sem
o devido pagamento de horas-extras, são esperadas após o Congresso
passar a lei.
Antes
de qualquer reforma, seria importante melhorar a regulação do
mercado de trabalho (aliás, regulação é algo péssimo por aqui),
desenvolver a qualificação profissional de forma a gerar empregos
mais sólidos, melhorar o sistema de ingresso nesse mercado (o que
inclui dar efetividade ao serviço nacional de intermediação de mão
de obra, pois o que existe em boa parte do país é o bom e velho
''gato'' intermediando) e, é claro, a redução na jornada sem
redução na jornada sem redução de salário – pleiteada pelos
trabalhadores e empurrada há anos.
O
cidadão deveria ter o direito de escolher um mandatário de acordo
com a agenda que ele propõe para os direitos trabalhistas e
previdenciários. Com um programa de governo debatido, votado e
eleito. Mas, aí, desconfio que não aconteceriam reformas.
Parte
dos jogadores está mudando as regras no meio do jogo, na
surdina. Os demais só perceberão o golpe quando for tarde demais e
eles tiverem sido excluídos do tabuleiro.
Do bllog do Leonardo Sakamoto
21/04/2017